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Poema
Romanceiro da Inconfidência
Paulo Augusto de Lima
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AFINAL,
QUEM FOI TIRADENTES?
Considerado
pela Coroa Portuguesa como o cabeça da conjuração Mineira, morto
por enforcamento, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes,
tornou-se herói nacional e uma das figuras mais polêmicas da nossa
história. Muito tem-se falado dele, mas sabe-se pouco de sua vida. O
que conhecemos dele encontra-se nos Autos de Devassa da Inconfidência
Mineira (Publicado pela Imprensa Oficial, Belo Horizonte,1982) em
alguns documentos. Mesmo assim, pela intensidade e pela trama em que
se meteu nos últimos anos de vida, nos foi legado um envolvente
material que nos permite não só polemizar, como discutir esta
figura, até certo ponto enigmática de nossa história.
Portanto,
para compreendermos quem foi Tiradentes e buscarmos algumas pistas de
seu papel na Inconfidência Mineira, é necessário analisarmos os
Autos como fonte e documentação históricas. Montados pelas
autoridades portuguesas, eles representam o poder da época
construindo fatos, escolhendo seus personagens e suas vítimas e mesmo
protegendo determinadas figuras quando isso convinha. Desta forma, ao
trabalharmos com os Autos, os utilizaremos como um documento/monumento
que reflete os conflitos que marcaram uma época. Segundo Jacques Le
Goff: “O documento é
monumento. Resulta do esforço das sociedade históricas para impor ao
futuro -
voluntária ou involuntariamente -
determinada imagem de si próprias. No Limite, não existe um
documento-verdade. Todo documento é mentira. Cabe ao historiador não
fazer o papel de ingênuo”.(Documento/Momumento,
Einaud, v.1, 1984, p.103)
Portanto,
é a partir desse conceito, que devemos trabalhar com os Autos, não esquecendo que os presos encontravam-se incomunicáveis,
sujeitos a toda forma de pressões psicológicas e torturas. Não é
por acaso que o réu Francisco Antônio de Oliveira Lopes acusa o
escrivão da Devassa, José Caetano César Manitti, de ter manipulado
seu depoimento, que já chegou lavrado e que ele assinou sem nem ao
menos ter lido. (Autos, v.4, p.275)
Em
outro documento, conhecido como Exposição
sobre a repressão e Julgamento dos réus da Inconfidência Mineira,
atribuído a Francisco Gregório Pires Monteiro Bandeira,
ex-Intendente de Vila Rica e amigo
de Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa, existe
outra acusação ao escrivão Manitti: “...
iludiu com promessa e insinuações; e, se algum resistia, com tratos.
Dos sacerdotes, alguns foram encerrados em prisões tão escuras, úmidas,
apertadas e fétida ...”. (Autos, v.9, p.254)
Vejamos,
então, como Tiradentes surge nos Autos, através de seus próprios
depoimentos e de seus companheiros de conjuração. Nas suas três
primeiras inquirições ele tanto nega o movimento como sua participação.
Perguntado sobre o levante responde: “...
que tal não há, que tudo é uma quimera, que ele não é pessoa, que
tenha figura, nem valimento, nem riqueza, para poder persuadir um povo
tão grande a semelhança asneira”. (Autos, v.9, p.254)
Assim,
ele negou até a quarta inquirição quando, repentinamente e sem uma
explicação plausível, confessa ser o cabeça da conjuração,
assumindo toda a responsabilidade pela tentativa de levante em Minas
Gerais. Foi a partir desta resposta que grande parte dos historiadores
começam a forjar sua trajetória de herói: “...que
ele até agora negou por querer encobrir a sua culpa, e não querer
perder ninguém; porém que a vista das fortíssimas instâncias com
que se vê atacado, e a que não pode responder corretamente senão
faltando clara, e conhecidamente à verdade, se resolve a dizê-la,
como ela é: que é verdade, que se premeditava o levante, que ele ...
confessa ter sido quem ideou tudo, sem que nenhuma outra pessoa o
movesse, nem lhe inspirasse coisa alguma, e que tendo projetado o dito
levante, o que fizera desesperado, por ter sido preterido quatro
vezes, parecendo a ele ..., que tinha sido muito exato no serviço, e
que achando-o para as diligências mais arriscadas, para as promoções
e aumento de postos achavam os outros, que só podiam campar por mais
bonitos, ou por terem comadres ...”. (Autos, v.5, p.36)
Em
outro ponto da inquirição, insiste que não havia um cabeça, mas
assume a responsabilidade de ser o primeiro a falar em conjuração: “que
não havia cabeça algum, que o réu ...fora sim o primeiro que falara
na matéria conversando a respeito da derrama, os mais foram seguindo,
e aprovando mas sem nenhum se fazer cabeça e na realidade sempre a
coisa ficou como meio feito no ar ...”. (Autos, v.5, p.44)
Entretanto,
a sua participação surge em quase todos os interrogatórios dos
demais envolvidos. A maioria revela um Tiradentes louco, falastrão,
leviano, uma pessoa sem maior importância e caráter. O Coronel
Alvarenga Peixoto afirma que o tenente-coronel Freire de Andrada,
comandante da Tropa Paga de Minas Gerais, e também conspirador,
insistia para que o ouvisse, pois: “fazia gosto que ouvisse ao dito Alferes Joaquim José, só por ver
quanto inflamado na matéria, que chegava a chorar...”. (Autos,
v.5, p.116)
Em
outra passagem refere-se a seu aspecto físico: “Neste
mesmo dia de tarde, estando ... no escritório de João Rodrigues
Macedo, lhe apareceu um oficial feio, espantado ... ”.(Auto,
v.5, p.116)
Em
um encontro entre Alvarenga e o Padre Oliveira Rolim, em que estava
presente Tiradentes, após sua retirada, o próprio Alvarenga informa:
“o dito padre disse a ele ...
que aquele rapaz era um herói, que se lhe não dava morrer na ação,
contando que ela se fizesse ...”. (Autos, v.5, p.121)
O
próprio Padre Rolim fala de um outro Tiradentes, muito diferente do
suposto “herói” de que nos
dá notícia Alvarenga: “...
porém como o mesmo alferes disse a ele ..., em outra ocasião, que a
alguns dizia que entravam várias pessoas a que ele não tinha falado
nem sabia que entrassem, por isso ficou na dúvida, e ainda hoje está
nela, de que o dito Desembargador entrasse ...”. (Autos, v.5,
p.348)
O
Padre Toledo e Melo, outro envolvido na conspiração, fala de
Tiradentes: “... O Alferes Joaquim José da Silva Xavier disse também, que ele
queria para si a ação maior, e de maior risco nesta conjuração
...”. (Autos, v.5, p.142)
É
neste depoimento que aparece um Tiradentes que chama para si a ação
de maior risco: ir a Cachoeira de Campo e cortar a cabeça do
Governador Visconde de Barbacena.
O
Cônego Luís Vieira, grande orador e entusiasta da Revolução
Americana de 1776, menciona-o em seu interrogatório, dizendo: “...
que o mesmo Alferes -
Tiradentes -
andava por Vila Rica por casa de várias meretrizes a prometer prêmios
para o futuro quando se formasse um República ...”.
(Autos, v.5, p.243)
É
nesse interrogatório que ele surge como um bêbado que vivia nas
tabernas e casas de prostituição, prometendo absurdos para as
pessoas, após a formação do novo governo. Assim, o Cônego sustenta
a tese do louco que não podia ser levado em consideração.
Entretanto,
os próprios juizes da Devassa desconfiavam que ele tivesse este
conceito tão negativo em relação a Tiradentes. O que podemos
constatar pelo teor de uma pergunta, que lhe foi feita: “...
aí disse que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha
Tiradentes, era um homem animoso, e o abonou, e que se houvesse muitos
como ele, seria o Brasil uma república florente” (Autos, v.5,
p.243)
O
depoimento de Vicente Vieira Mota, guarda-livros dos contratos do poderoso comerciante João Rodrigues de Macedo, é cheio de
referências a Tiradentes. Para ele, o Alferes era um louco sem
limites que falava publicamente sobre liberdade e a República que se
pretendia instalar nas Minas Gerais: “...
que já era mui público ele andar com aquelas loucuras, e despropósitos
tanto naquela Vila, como nesta cidade do Rio de Janeiro ... a que ele
impaciente tornou, dizendo-lhe, o certo é que já não há homens;
porém que havia de armar uma meada tal, que em dez, vinte, ou cem
anos se não havia de desembaraçar ...” (Autos, v.5, p.406-407)
Ainda
para o guarda-livros, até o famoso médico de Vila Rica, Dr. Tomás
de Aquino Belo e Freitas o considerava um louco ao falar em liberdade
pelas tavernas da cidade: “(...)
tanto assim, que em uma ocasião, segundo o seu parecer depois das
prisões, o médico Belo, falando-se nas ditas prisões, dissera em
sua casa, que o dito Alferes era tão louco, que até pelas tavernas
andava falando em República e liberdade de Minas”. (Autos, v.5,
p.409-410)
Porém,
outros personagens vão se ocupar da figura de Tiradentes de uma
maneira diferente, nos legando uma imagem até hoje aceita, e
consolidada no nosso imaginário.
São
duas narrativas de frades franciscanos que testemunharam os momentos
derradeiros dos inconfidentes: “Últimos
momentos dos Inconfidentes de 1789, pelo frade que os assistiu em
confissão”, de Frei Raimundo da Anunciação Penaforte, que, na
província franciscana da Repartição Sul, ocupava o cargo de Custódio
da Mesa, de 1792 e “Memórias do êxito que teve a conjuração de Minas e dos fatos
relativos a ela acontecidos nesta cidade do Rio de Janeiro desde 17 até
26 de abril de 1792”, atribuída por Tarquínio J.B de Oliveira
ao Frei José Carlos de Jesus do Desterro, guardião do convento de
Santo Antônio.
Nestes
testemunhos/narrativas vislumbramos as primeiras tentativas de
formalizar, contemporaneamente, a memória histórica de Tiradentes e
da Inconfidência Mineira. Elaboradas segundo o ideal e imaginário
cristão, estão repletas, principalmente, de representações histórico-culturais
destes autores.
Assim,
Tiradentes torna-se modelo de cristão, generoso, arrependido,
castigado, mas preparado para bem
morrer. Segundo Frei Desterro, Tiradentes recebeu sereno e
convencido da gravidade de seus pecados a sentença de condenação.
Após a leitura do Decreto Régio, sua reação foi de alegria pelos
outros réus que
receberam o perdão real, e pouco trabalho tiveram seus confessores em
seu consolo, pois já estava “humilhado
e contrito, exercitando-se em muitos atos das principais virtudes” (Autos,
v.9, p.108)
Descreve
sua caminhada para a forca, como se fosse o próprio Cristo: beija os
pés e perdoa o carrasco; recebe a alva, despe a camisa e fala: “Nosso Senhor morreu nu por meus pecados ...”; caminha com o
crucifixo na mão, certo de
“oferecer a morte como sacrifício a Deus”. (Autos, v.9,
p.108)
Também
Frei Raimundo Penaforte relata os momentos derradeiros de Tiradentes,
descrevendo a cena com o carrasco e a preparação para a execução,
traçando, também, seu perfil cristão: “Ligeiramente
subiu os degraus; e sem levantar os olhos que sempre conservou
pregados no crucifixo, sem estremecimento algum, deu lugar ao carrasco
para preparar o que era necessário; e, por três vezes, pediu-lhe
para abreviar a execução” (Autos. v.9, p.174)
Assim,
os frades franciscanos nos legaram um Tiradentes arrependido de seus
pecados e culpa, uma imagem idealizada segundo os princípios cristãos.
No
final do período monárquico a vida histórica da Inconfidência
Mineira é refeita. O acontecimento é acolhido através de novas
reconstruções que lhe dão vida e, por sua vez, resgatam os valores
presente, inevitáveis e necessários à perpetuação ou criação do
passado histórico.
O
marco historiográfico que coloca a Inconfidência Mineira novamente
em evidência é o livro do monarquista Joaquim Norberto de Souza e
Silva, História da Conjuração Mineira, de 1873. Em um trabalho de fôlego,
quando pela primeira vez são utilizados os Autos e outros documentos
importantes por ele descoberto, o autor não deixa transparecer que
Tiradentes pudesse ser o líder do movimento. Na sua visão, ele não
passava de uma pessoa leviana, aliciado pelos ideais libertários de
Álvares Maciel. Apesar de considerá-lo tenaz e fogoso, não
acreditava que tivesse condições, principalmente por sua falta de
caráter, de ser o cabeça da conjuração. Ao contrário, a sua
presença era muito mais nefasta do que benéfica para a causa do
movimento.
Na
vida ou na morte, Tiradentes não foi bem acolhido por Joaquim
Norberto. Porém, delineia-se em sua obra o mesmo comportamento sereno
e cristão traçado pelos frades franciscanos: “dirigiu
como um mártir cristão brandas palavras repassadas em unção e de
amor ao próximo ao padre que confortava dizendo que morria cheio de
prazer”. (SILVA, v.2, p.203)
A
sua imagem é propagada, permanecendo o homem cristão resignado e
convicto da vida eterna. Porém, não é desta forma que Joaquim
Norberto gostaria de vê-lo diante da morte. Para ele, esta não era
uma morte digna de um herói, que não deveria morrer arrependido,
contrito, humilde e conformado: “Morrera o Tiradentes, não como um grande patriota, com os olhos
cravados no povo, tendo nos lábios os sagrados nomes da pátria e da
liberdade ... mas como cristão preparado há muito tempo pelos
sacerdotes”. (SILVA, v.2, p.211)
O
historiador José Murilo de Carvalho, em seu livro, A
Formação das almas, nos mostra a busca republicana por um herói
que representasse um mito de origem. Este foi Tiradentes, herói místico,
que Joaquim Norberto delineou com o objetivo de desqualificá-lo por
sua postura cristã, acabando por contribuir para sua mitificação.
Para Carvalho, o êxito de Tiradentes estava na sua identificação
com Cristo, passando pelos mesmos sacrifícios, tocando o sentimento
popular. Portanto, os republicanos tomam a dianteira da apropriação
de sua memória, uma vez que, segundo Carvalho: “a
elaboração de um imaginário é parte da legitimação de qualquer
regime político”. (CARVALHO, p.10)
Surge,
então, a obra do historiador e pensador cristão, Lúcio José dos
Santos, A Inconfidência Mineira - papel de Tiradentes na Inconfidência
Mineira, de 1927. Suas idéias coincidem com a forma de pensar dos
narradores religiosos do século XVIII. Ele resgata a figura de
Tiradentes, colocando-o como o grande líder da Inconfidência
Mineira.
Assim,
para Lúcio dos Santos, a grande lição histórica da Inconfidência
foi a prova que Tiradentes deixou de dedicação religiosa e de sacrifício.
Acreditava que “quem é
incapaz de sacrifício, é incapaz de amar, é incapaz de
patriotismo”. (SANTOS, p.29)
A
tentativa de deixar para os futuros leitores a imagem de mártir em
sintonia com os ideais religiosos não foi em vão. Os resultados,
encontramos na própria historiografia da Inconfidência, no
Tiradentes dos monumentos e obras de arte e finalmente como parte do
nosso imaginário mítico.
O
movimento sobrevive no tempo. As obras historiográficas, que utilizam
os Autos e as narrativas como fonte histórica, constituíram a
sobrevida necessária para que a Inconfidência Mineira não
permanecesse no esquecimento.
Vários
cronistas, estudiosos, historiadores, poetas e compositores escreveram sobre Tiradentes e seu ideal de liberdade: Cecília
Meireles, no Romanceiro da
Inconfidência, exalta o “animoso
Alferes” (p.79), o
historiador Francisco Iglésias falou da generosidade e do símbolo do
homem livre, “com o sentido de dignidade da pátria e do cidadão” (Minas
de Liberdade, p.25); para o compositor Fernando Brant, o corpo
espalhado em quatro cantos “são
sonhos que nos alimentam de vida e de esperança” (Idem, p.31);
o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, diz que “o sonho de liberdade não morre, mesmo quando esquartejada, e que o
futuro tem gosto de Tiradentes” (Idem, p.39); o escritor e jornalista Zuenir
Ventura, com os olhos no presente, afirma “
que hoje ele não se conformaria: iria lutar também pela cidadania -
ainda que tardia” (Idem,
p.63), e o cronista e
romancista Otto Lara Resende
fala com intimidade de um rapaz meio maluco e sonhador: “A
chama que ele acendeu não pode se apagar, mas sempre corre perigo. A
utopia do Tiradentes continua por isso atualíssima. Ela cabe numa
palavra -
Liberdade”. (Idem,
p.91)
O
brasilianista Kenneth Maxwell, em seu livro A
Devassa da Devassa sugere que Tiradentes foi o bode expiatório escolhido pelas autoridades portuguesas:
“Não era influente, não tinha importantes ligações de família,
era um solteirão que passava a maior parte de sua vida à sombra de
protetores mais ricos e bem-sucedidos”. (MAXWELL, p.215-216)
Para
ele Tiradentes era um homem cheio de ressentimentos, ambicioso,
lutando por uma ascensão social dentro da estrutura implantada pela
coroa portuguesa. Assim, afirma que: “Era
óbvia a sedução que o enforcamento do alferes representava
para o governo português: pouca gente levaria a sério um
movimento chefiado por um simples Tiradentes...”. (MAXWELL,
p.216)
Resta-nos
a pergunta: Afinal, quem foi Tiradentes? Apesar de tudo que se tem
escrito e falado, sabemos muito pouco de sua vida. Ainda estamos
presos aos Autos -
o documento-monumento montado pelo poder e saber de uma época -
para levantarmos algumas hipóteses em relação a sua figura e ao seu
papel na Inconfidência Mineira.
Possivelmente,
sua função fosse a de atrair e seduzir novos elementos para o
levante. Era o aliciador que circulava por todos os lugares e no meio
do povo. Ele próprio em
um de seus interrogatórios nos fornece uma pista: “Em
conseqüência do ajuste. De que ele ... capacitasse, e seduzisse as
pessoas que pudesse, para entrar na sublevação, e motim, procurou
ele ...falar a algumas pessoas, usando da arte, que lhe parecia necessária
conforme caracteres delas, e aproveitando as ocasiões, que se lhe
ofereciam para isso ...”. (Autos, v.5, p.37-38)
Além
do mais, vários dos envolvidos na conspiração declararam que foram
convidados por ele para tomarem parte na sedição que se preparava. O
tenente coronel Francisco de Paula Freire de Andrada afirma: “Que
a primeira pessoa que lhe falou na matéria do levante, e conjuração,
que se premeditava fazer na Capitania de Minas Gerais, foi o Alferes
Joaquim José da Silva Xavier...”. (Auto, v.5, p.180)
José
Álvares de Maciel, jovem estudante que acabara de chegar da Europa
cheio de idéias novas, diz
“... que a primeira vez que ouviu a má proposição, de que a
Capitania de Minas Gerais havia de ser independente e livre, foi ao
Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha -
o Tiradentes - ...”.
(Autos, v.5, p.327)
O
Padre Manuel Rodrigues da Costa, também, revela suas conversações
com o Alferes: “...se lembra
que o mesmo alferes lhe falou em que havia de falar a alguns soldados,
e oficiais para aquilo mesmo”. (Autos, v.5, p. 490)
Sabemos
que a maioria dos indiciados tentou incriminá-lo. Se foi Tiradentes o
cabeça da conjuração, não se pode afirmar com certeza. Porém, por
força de ofício, sabemos que ele circulou com bastante desenvoltura
e, por onde passava, exercendo a arte de falar, propagava a conjuração.
Contudo, sua imagem foi cuidadosamente e deliberadamente trabalhada
pelos frades franciscanos e, mais tarde, apropriada pelos republicanos
em busca da legitimação do novo regime. O resto ficou por conta da
historiografia, dos políticos, dos poetas, dos cronistas, dos
romancistas, dos artistas, dos estudiosos, enfim, das paixões
humanas, que o transformaram em mito de origem do nosso ideal de
liberdade.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
AUTOS
DE DEVASSA da Inconfidência Mineira. Belo Horizonte, Imprensa Oficial
de Minas Gerais, v. 1-9, 1976.
CARVALHO,
José Murilo. A Formação das
Almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Cia da
Letras, 1990.
LE
GOFF, Jacques. Documento/Monumento. Enciclopédia
Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1984.v.1. p.103.
MAXWEEL,
Kenneth. A devassa da Devassa - A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal
1750-1808. 3ª ed, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
MINAS
de Liberdade. Belo Horizonte: Assembléia Legislativa do Estado de
Minas Gerais/Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, 1992.
SANTOS,
Lúcio José dos. A inconfidência
Mineira: Papel de Tiradentes na Inconfidência Mineira. Belo
Horizonte: Imprensa Oficial, 1972.
SILVA,
Joaquim Norberto de Souza. História
da Conjuração Mineira. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1948.
Curriculum
Vitae resumido
Sérgio
Vaz Alkmim - Professor de História da Rede Municipal de Contagem,
Pesquisador e Economista, Pós-graduado em Administração Financeira
pela UNA e Pós-graduado em Novas Tecnologia em Educação e
Treinamento pela UNI/BH. Foi Secretário Executivo do Projeto PROCERA/LUMIAR/INCRA
- Programa de Crédito Agrícola e Assistência Técnica aos Projetos
de Assentamento de Reforma Agrária. Publicou, entre outras, a
monografia Inconfidência
Mineira: a vida histórica do acontecimento, Revista do tribunal
de Contas do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte, Ano XIV, N.º 4,
1996 e o artigo Tiradentes: a
origem do mito e o mito de origem, Jornal Estado de Minas. Opinião.
Belo Horizonte, 21/04/1997, p.7. Pesquisador da história política de
Minas Gerais, sendo Coordenador da biografia política do governador
Ozanam Coelho, no Prelo e do Presidente do Estado João Pinheiro.
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