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ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA
Romanceiro da Inconfidência Da bandeira de Minas Cecília Meireles
Através de grossas portas Sentem-se luzes acesas E há indagações minuciosas dentre das casas fronteiras Olhos colados aos vidros mulheres e homens a espreita caras disformes de insônia vigiando as ações alheias. Pela greta das janelas, pelas frestas das esteiras agudas setas atiram a inveja e a malediscência. Palavras conjecturadas oscilam num ar de surpresa com peludas aranhas nas gosmas das teias tensas, rápidas, envenenadas, engenhosas, sorrateiras.
Atrás de portas fechadas, a luz de velas acesas brilham fardas e casacas junto com batinas pretas. E há finas mãos pensativas entre galões, sedas, rendas. E há grossas mãos vigorosas de unhas fortes, duras veias. E há mãos de púlpitos e altares, de evangelhos, cruzes, bençãos.
Uns são reinóis, uns mazongos, mas pensam de mil maneiras. Citam Vírgilio e Horácio, refletem e argumentam, falam de minas e impostos, de lavras e fazendas, de ministros e rainhas e das colônias inglesas.
Atrás de portas fechadas, a luz de velas acesas Entre sigilo e espionagem acontece a inconfidência. E diz o vigário ao poeta: escreva-me aquela letra, o versinho de Vírgilio, E dá-lhe o papel e a pena. E diz ao poeta ao vigário com dramática prudência: tenha meus dedos cortados antes que tais versos escrevam!
Liberdade ainda que tarde, ouve-se ao redor da mesa. E a bandeira já está viva e sobe na noite imensa.
Atrás de portas fechadas, a luz de velas acesas Uns sugerem, uns recusam, uns ouvem, uns aconselham. Se a derrama for lançada, há levante com certeza.
Oh! Vitórias, festas, flores das lutas da independência. E a vizinhança não dorme, murmura, imagina, inventa. Não fica a bandeira escrita, mas fica escrita a sentença.
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